Prefeitura de Belford Roxo vai acabar com IFRJ voltado para área de artes

Unidade de ensino forma profissionais de moda e apoia artesãs da cidade

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Branco é a cor da opressão” é o título do ensaio que ilustra esta reportagem. É também uma frase que surge a partir do pensamento crítico de uma geração de jovens negros e suburbanos num lugar nem um pouco esquecido: Belford Roxo.

Há duas maneiras de olhar para ‘Bel’ (os íntimos chamam a Cidade do Amor pelo apelido): uma é a partir da violência que repercutiu mundialmente no século passado e deixou rastros até hoje, quando imagens de milícias armadas no centro da cidade circularam pelo país. A outra maneira é através da arte, que repercutiu mundialmente com nomes como Cidade Negra, O Rappa, Inocentes de Belford Roxo e outros, que também se perpetuaram através de novos artistas que mantiveram o sonho vivo nas rodas culturais e grupos de teatro, literatura e outras expressões.

É no campo das artes que o IFRJ de Belford Roxo atua. Não só nas artes, mas no pensamento crítico de forma geral. O campus oferece cursos básicos e também de formação continuada, capacitando trabalhadores dentro do subúrbio em setores que costumam ser liderados por pessoas ricas, distantes da realidade de lugares como São Bernardo – um bairro no subúrbio do subúrbio cuja busca no Google Imagens destaca enchentes, ruas sem calçada e nenhum ponto turístico.

O campus tem ênfase em áreas relacionadas à indústria criativa – com foco em design, moda, vestuário, calçado, acessórios e urbanismo. Também forma professores para a área de artes, criando um ciclo de conhecimento no próprio território. Atualmente o campus oferece o Curso Técnico Concomitante/Subsequente em Produção de Moda, os cursos de Formação Inicial e Continuada em Empreendedorismo e Gestão de Negócios, Desenvolvimento de Produto Têxtil e de Moda, Adereços de Carnaval, Blogueiro(a) de Moda, Gestão de Vendas e Negócios de Moda, Estamparia e Tingimento Artesanal e diversos cursos de extensão.

Na contramão dos potenciais de geração de riqueza, da quebra do ciclo de pobreza e da formação artística e cidadã da juventude, a cidade aprovou a Lei municipal Nº 1.607, de 09 de junho de 2020, em sessão da Câmara dos Vereadores que revogou a doação do terreno onde foi instalado o Campus Belford Roxo – que está em funcionamento, mesmo com um histórico de disputas judiciais que chegaram a embargar as obras da unidade.

Em nota, o IFRJ informou que “os diálogos entre o IFRJ e a Prefeitura Municipal de Belford Roxo para implantação do campus tiveram início no ano de 2011. Contudo, a doação do terreno aconteceu em 2013, por meio das Leis Municipais Nº 1.479 de agosto de 2013 e Nº 1.520 de setembro de 2014. Em 2015, após as instalações iniciais do campus estarem em funcionamento e suas obras em andamento, a Prefeitura Municipal de Belford Roxo abriu processo judicial visando a retomada do terreno, inclusive, mediante o embargo das obras que estavam sendo realizadas e impedindo a continuidade das mesmas”.

Apesar de todo o cenário contrário ao funcionamento do campus, projetos como a Revista VAN, o Núcleo de Apoio ao Artesão e outros escancaram a urgência de uma unidade como essa, que gera riqueza para o entorno. Além disso, a comunidade de servidores e estudantes do campus ofereceram, até o momento, dois cursos técnicos e 27 cursos de qualificação profissional, atendendo desde o início de seu funcionamento centenas de jovens e adultos trabalhadores das mais diferentes localidades da Baixada Fluminense.

A reitoria do IFRJ informou ainda que “realizará todas as ações judiciais possíveis para a revogação da lei municipal ora aprovada que representa, no entendimento de todos da comunidade do IFRJ, um retrocesso na oferta da educação profissional pública, gratuita e de qualidade no Estado do Rio de Janeiro”.

De volta a 2018, quando apresentou a primeira edição da Revista Van, a professora Lara Ovídio falou sobre a presença de militares no campus do IFRJ naquele momento da história, que deixaram um prejuízo na parede da cozinha da unidade: “O estrondo provocado pelo choque de uma caminhonete contra a parede pareceu um mal presságio”.

Agora caberá à justiça decidir que tipo de presságio será esse.

Foto de abertura:
Ensaio “Branco é a cor da opressão
Foto: Angelo Pontes
Styling e direção de arte: Karina Romano
Beleza: Adryel Barboza
Produção: Mércia Camilo
Modelo: Julia Freitas

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