Iguaçuano Vitor Andre “Super Choque Carioca” usa o humor para tratar de questões raciais

Humorista e mestre de cerimônias ganhou visibilidade com vídeos curtos

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Iguaçuano Vitor Andre “Super Choque Carioca” usa o humor para tratar de questões raciais

A geração que cresceu assistindo ao desenho “Super Choque”, exibido na televisão aberta brasileira no início dos anos 2000, pode ter na figura do humorista iguaçuano Vitor Andre um resgate da infância. Mas não é apenas um exercício de nostalgia que o humorista propõe.

Segundo Vitor, depois que passou a usar dreadlocks passou a ser conhecido através do nome do personagem do desenho entre amigos, na loja onde trabalha, entre clientes e pelo mundo virtual. Por isso resolveu criar o “Super Choque Carioca” dublando vídeos do próprio desenho com humor sarcástico e sotaque da região do grande Rio falando sobre questões como a fragilidade da heterossexualidade branca, a invisibilidade periférica e questões raciais. A notoriedade crescente veio junto do isolamento social pela pandemia do novo coronavírus no Brasil: Vitor passou a produzir mais e as pessoas com maior atenção para as redes sociais passaram a notar o trabalho feito por ele.

Antes do sucesso com Super Choque Carioca Vitor Andre publicava vídeos chamados de “skate narrado” trazendo o próprio Vitor praticando o esporte nas pistas de Nova Iguaçu. Os cortes trazem uma edição dinâmica, cenas em combinação com uma narração que mistura humor com as próprias quedas e sarcasmo com referências mais amplas como contexto político, por exemplo. Em diversos vídeos feitos nas praças da cidade há piadas relevantes com o fato de agentes de segurança serem tão vigilantes com skatistas negros. Mas foi com o Super Choque Carioca que as coisas mudaram para o iguaçuuano do Marco 2 (ou Alvorada).

A história com o desenho tem dois pontos muitos marcantes para o humorista. Primeiro a obra do acaso no início do período de quarentena através de um amigo chamado Lucas Dow que mostrou uma publicação com a abertura do desenho Super Choque. De acordo com Vitor, “aquilo foi um start pra mim”. Com isso passou a baixar os vídeos e fazer narrações utilizando o humor. O segundo ponto é desenvolvido através da lembrança de ter assistido a animação. O Super Choque trouxe à época o inédito registro de possuir uma gama de personagens majoritariamente negros. É o semelhante em animação de obras da mesma época como o seriado Todo Mundo Odeia o Chris, criado e produzido pelo humorista Chris Rock, por exemplo. Em um dos episódios mais emblemáticos de Super Choque há um debate sobre racismo registrado na memória e que marcou Vitor ainda criança:

“Lembro perfeitamente de quando ele vai dormir na casa do amigo loirinho dele, o Richie. Ele só foi dormir na casa do amigo porque o pai do Richie não estaria em casa. Esse pai era um personagem muito racista. Nesse dia trocou o plantão do serviço e chegou de surpresa em casa, comete vários tipos de racismo durante o jantar, o Super Choque falando pro amigo que estava tudo bem, que o pai dele tinha tido um dia pesado de trabalho, devia estar cansado. Em um momento ele sai do quarto pra escovar os dentes e vê os pais do amigo brigando, o pai falando que não aguentava mais ver negros nas ruas e agora debaixo do teto dele. Esse episódio de um desenho animado foi um divisor de águas pra mim”.

A questão racial é tratada pelo humorista como oportunidade de ser escutado. “A utilização do humor é um caminho de verbalização mais ampla porque”, diz Vitor, “o brasileiro se guia por memes, por zoeira e é esse o momento pra ser escutado pra fazer rir e falar de coisas sérias”. Segundo Vitor, o racismo é algo instaurado no Brasil e pra uma criança como ele ver aquilo foi realmente sentir o mundo de uma forma diferente.

Quando falo sério as pessoas falam que é “mimimi”, não querem ouvir sobre questão racial e de desigualdade. Pelo humor essas coisas chegam na mente das pessoas, é através dele que consigo passar a minha mensagem.

Através desse sucesso na internet Vitor André já ganhou a atenção de comediantes consagrados como o carioca Yuri Marçal e o baiano João “Seu Pimenta”, referências dentro do humor nacional. Quando perguntado se estaria preparado para alçar voos mais altos, o Super Choque Carioca responde: “eu trabalho em loja, faço vídeos, nunca estive despreparado, e tu acha mesmo que a gente da Baixada não tá preparado pro sucesso? É de Nova Iguaçu para o mundo”.

Ele continua: “Eu posso dizer que o Super Choque Carioca mudou a minha vida porque eu quero viver de humor, quero ser um humorista que vive de humor, quero entrar no stand-up comedy e através do Super Choque Carioca eu ganhei alcance. Sou comediante desde que me entendo por gente”.

Como todo humorista, já está preparado para responder a questão clássica sobre os limites do humor. Vitor diz: “os limites do humor? É que nem os tapas da minha mãe: não tem limites.” Quando perguntado de onde é, Vitor diz: “sou da Baixada Fluminense, de Nova Iguaçu, a capital do Rio de Janeiro”. E ele ri. É, de fato, de Nova Iguaçu para o mundo.

Serviço:
Canal: https://www.youtube.com/channel/UCsqNYUrcUsVegiCl8ru_Aww/videos
Twitter: @vittorandre1
Instagram: https://www.instagram.com/ovitorandre/

Foto de capa: Pedro Kremmer

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